INQUISIÇÃO - (O Início da Santa Inquisição) - Parte 3

"Santo Ofício da Inquisição em Portugal


Os portugueses de origem judaica perseguidos pela Inquisição espalharam-se pelos quatro cantos do mundo, levando seus costumes, religião, língua, alimentação, folclore, literatura, que preservaram durante séculos.

Pressionado politicamente, o sumo pontífice deixou-se convencer, e em 22 de agosto de 1681 o tribunal português reiniciou suas atividades. Desde então se intensificaram as perseguições e se realizaram autos-de-fé praticamente todos os anos.

Na revolução da Catalunha, em 1640 o próprio inquisidor sugeriu que o tribunal iniciasse um processo contra os rebeldes, e na guerra de Sucessão 1702 - 1714 a Inquisição ameaçou de censuras eclesiásticas os culpados de opiniões contrárias.

No que diz respeito a Inquisição portuguesa, sua implantação política também se revelou bem clara desde o seu estabelecimento. Quando o tribunal da Inquisição portuguesa entrou em funcionamento regular, as forças políticas e espirituais da nação estavam unidas: rei e inquisidor eram a mesma pessoa.

Apesar de todo o aparato religioso e da auréola divina com que o tribunal da Inquisição se revestiu apesar das funções "santas" que alegou, foi uma instituição vinculada ao Estado. Respondeu dos interesses das facções do poder: coroa, nobreza e clero. Infelizmente, depois da metade do século XVII, não temos monografias nem pesquisas suficientes sobre suas atividades comerciais em outras regiões, para podermos precisar a medida de sua importância no mundo financeiro europeu e internacional.

A Inquisição sempre esteve na pista dos homens de negócio. Para isto contava com um séquito de funcionários que atuavam como espiões, trazendo informações e denúncias de portugueses residentes nas colônias, na Holanda, em Hamburgo, na Itália, na França, em Londres, etc.

A limitação dos direitos dos descendentes de convertidos através da aplicação dos estatutos de pureza de sangue também foi uma tentativa da nobreza feudal de eliminar uma parte da burguesia os cristãos-novos que tinham criado força e aspiravam o domínio sobre o Estado. A Inquisição era uma ameaça permanente e servia-se de todos os pretextos para confiscar e perseguir os homens de negócios cristãos-novos. Durante a união com a Espanha a burguesia portuguesa enriqueceu e os cristãos-novos tiveram atuação importante como financistas da coroa espanhola. Depois de 1640 sofreu um declínio, e os estrangeiros ingleses, holandeses, alemães, franceses, estabelecidos em Lisboa e protegidos por diversos tratados, deram golpe mortal nos comerciantes nacionais.

Nesta época dois fatos interferiram no funcionamento da Inquisição portuguesa que levaram ao pronunciamento do Papa; um texto divulgado clandestinamente, e intitulado Notícias Recônditas, escrito por um notário da Inquisição, que delata os métodos, as injustiças, os crimes praticados pela Inquisição em Portugal, e a interferência de um jesuíta, o Padre Antônio Vieira, que, quando em Roma, ajudou a desmascarar a dita "cristianíssima e santa Inquisição".

Um suspeito podia ser preso a qualquer momento, sem saber o que se queria dele. Nunca ficava conhecendo o nome de quem o acusou, nem lhe era comunicado o motivo da prisão, nem o lugar em que havia cometido o crime de que era acusado, nem com que havia pecado. Com o tempo a Inquisição introduziu uma farsa, um advogado de defesa, mas este não podia examinar o processo, era escolhido pelos Inquisidores, sendo um funcionário do Tribunal.

Métodos de Ação do Tribunal

O Tribunal da Inquisição orientava-se, como já dissemos, por um Regimento Interno, onde estavam sistematizados as leis, jurisprudência, ordens e prazos a serem seguidos.

Os crimes julgados pelo Tribunal eram de duas naturezas: contra a fé, como judaísmo, protestantismo, luteranismo, deísmo, libertinismo, molinismo, maometismo, blasfêmias, desacatos, críticas aos dogmas; e contra a moral e os costumes, como bigamia, sodomia, feitiçaria etc, com toda sua série de modalidades, e que se misturavam com o campo religioso.
Os crimes contra a fé eram considerados mais graves do que os crimes contra os costumes e a moral, e as suas penas eram muito mais severas. Os réus acusados de crime contra a fé tinham quase sempre seus bens confiscados, enquanto os infratores dos costumes recebiam sentenças leves e raramente pena de morte.
A base sob a qual se apoiava a Inquisição era a denúncia. Aceitavam-se denúncias de qualquer categoria de pessoas e mesmo cartas anônimas. O crédito das testemunhas dependia exclusivamente do arbítrio dos inquisidores. "Ouvir dizer" e "suposições" também eram considerados provas.

Quando um indivíduo era denunciado, um funcionário da Inquisição ia a sua casa, acompanhado pelo juiz do fisco, que seqüestrava tudo que o suspeito possuía, antes mesmo de ter provas de sua culpa. Depois de prendê-lo, passava ferros e trancas nas portas da casa e ninguém mais podia entrar a não ser os funcionários da Inquisição. A família ficava na rua, sem abrigo, as crianças à mercê da caridade dos vizinhos, esperando que alguém as socorresse. Muitas vezes os filhos jamais reviam seus pais e famílias ficavam para sempre separadas, como aconteceram tantas vezes com os presos no Brasil. Outras vezes, a Inquisição mandava que se arrasasse a casa em que haviam morado o herege e sua família, para que não ficasse dele um sinal sobre a terra. Os descendentes de um penitenciado pela Inquisição eram considerados infames por várias gerações e impedidos de qualquer participação na sociedade.

Todo réu, para salvar-se, tinha de confessar-se culpado, e acusar as pessoas de sua intimidade: pais, irmãos, parentes, amigos. Se não denunciasse a família era considerado diminuto, isto é, estava escondendo culpados. Caso não mencionasse todos os nomes, a confissão era considerada incompleta. Nesse caso, mandavam-no para a câmara de tortura. Confuso, no desespero de querer salvar-se, o réu prometia denunciar mais, e acusava todas as pessoas que conhecia: amigos de infância, pais, filhos, irmãos, parentes etc. Uma testemunha era suficiente para justificar o envio para câmara do tormento. Quanto mais débil a evidência do crime, mais severa era a tortura. Em Lisboa se retalhavam, as plantas dos pés dos réus, untavam-se de manteiga e em seguida os submetiam ao calor de braseiro. O Regimento de 1640 estabeleceu dois tipos de tortura: o potro, uma espécie de cama de ripas onde o réu era amarrado pelos pulsos e pernas e, ao aperta-se um arrocho, cortavam-se-lhe as carnes; e, a polé, quando o réu era suspenso no teto pelos pés, deixando-o cair em seguida, sem tocar o chão. No potro, graduava-se o tormento, apertando um após outro os membros. Na polé levantava-se o condenado a alturas diferentes, até a roldana, repetindo-se as quedas. Esse tormento, muitas vezes , deixava os réus aleijados, e para maior hipocrisia perante a sociedade, os inquisidores mandavam que não fosse aplicado nos últimos quinze dias antes de o réu sair no auto-de-fé para que o povo não viesse as marcas deixadas pela tortura.

A pena de morte pela fogueira recebiam os réus que recusavam confessar-se culpados. Eram chamados contumazes, pois, negando, continuavam persistindo no crime. E também os relapsos, que, já tendo sido condenados, tornavam a pecar. Se no último momento, antes de se aplicar a pena de morte, o réu se dizia arrependido, e pedia para morrer na Lei de Cristo, era primeiramente estrangulado e depois atirado na fogueira. Se, porém, persistia em dizer que queria morrer na lei de Moisés, era queimado vivo. Os que fugiam eram queimados "em efígie", isto é, simbolicamente.

A flagelação era um castigo dos mais comuns. O indivíduo era açoitado através das ruas da cidade, despido até a cintura, muitas vezes montado num burro, enquanto as pessoas lhe atiravam pedras e detritos.

Os Autos de Fé

Durante o auto-de-fé, os réus ouviam suas sentenças. Os condenados a morrer na fogueira, depois da cerimônia eram transportados para o lugar onde se erguia o queimadeiro.

O auto-de-fé começava com a procissão seguida de uma missa. O sermão tinha uma importância toda especial, e o pregador era sempre escolhido entre os mais distinguidos membros do clero.

O auto-de-fé era celebrado com enorme pampa. Comparava-se a participação do povo com a promessa de que quem assistisse ao auto-de-fé ganhava quarenta dias de indulgência. O povo era avisado com um mês de antecedência.

Em Portugal e na Espanha a Inquisição converteu-se em um poderosíssimo Estado dentro do Estado. Houve tempos em que sua ação foi mais branda e houve períodos de enorme ferocidade. Avaliar com precisão quantas pessoas foram penitenciadas e condenadas pela Inquisição moderna na Espanha e em Portugal e suas colônias de ultramar é tarefa praticamente impossível.

O número de autos-de-fé em Portugal ainda não era conhecido. Oliveira Marques dá alguns que são também suposições. De 1543 a 1684 a Inquisição de Portugal queimou em autos-de-fé pelo menos 1379 pessoas, numa média de cento e trinta e seis por ano. De 1684 a 1747 foram sentenciadas 4672 pessoas e 146 foram queimadas. Na década de 1704 foram sentenciadas 1392 pessoas (cento e trinta e nove por ano) e 17 executadas. De 1724 a 1733 morreram 22 pessoas e 1070 foram condenadas. De 1734 a 1743 o número de execuções subiu a 51 e de 1750 a 1759, já no tempo do Marquês de Pombal, 18 foram queimadas e mais de mil foram penitenciadas. Segundo Cecil Roth, a Inquisição portuguesa processou quarenta mil pessoas, queimou mil oitocentos e oito (633 em efígie), condenou 29.590. A Inquisição de Goa processou 3800 pessoas em 82 autos-de-fé.

Desde o estabelecimento do tribunal da Espanha em 1480, até 1808, foram queimados 31.912 hereges (em efígie 17.659). Foram penitenciadas 291.450 pessoas, num total de 341.021. De 1780 até 1820 houve cerca de 5.000 processados.

Todos esses dados são aproximados e com o avanço das pesquisas devem ser renovados. Autores que procuram justificar a Inquisição refere-se aos números relativamente baixos de condenados, e dizem que os tribunais civis eram tão ou mais severos, e mataram mais gente."

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